JUIZ FEDERAL DEFENDE NOVO MARCO LEGAL PARA DESTRAVAR O DESENVOLVIMENTO DO SETOR NUCLEAR NO BRASIL

Por Davi de Souza (davi@petronoticias.com.br) –

WhatsApp Image 2020-05-26 at 20.25.29O setor nuclear pode viver um ciclo de desenvolvimento considerável no Brasil caso a legislação do país passar a permitir a participação privada no setor. Esta é a conclusão de uma tese de doutorado defendida pelo Juiz Federal da 5ª Vara Ambiental de Rondônia, Dimis Braga. Em entrevista ao Petronotícias, o magistrado e Doutor em Ciências Jurídicas pela Universidade do Vale do Itajaí afirma que “o Brasil deve buscar um consenso nacional para encontrar os meios e demonstrar à sociedade a importância e a necessidade da energia nuclear por meio de um novo marco constitucional”. O juiz explica ainda que este novo marco para a abertura do setor só pode acontecer se houver uma revisão da Constituição. “No passado, os serviços e instalações de energia elétrica e o aproveitamento energético dos cursos de água eram de competência só da União, sem a possibilidade de participação privada. Mas esses mercados foram  aberto. Por que não fazer o mesmo com o nuclear, já que outros mercados foram abertos?”, questionou. Braga acredita que a abertura do segmento nuclear brasileiro poderia atrair novos investimentos para o país. “O Brasil dispõe de empresas que estão aguardando esse processo, interessadas em investir, aguardando esse processo de abertura econômica do setor para viabilizar uma mudança no paradigma de exploração mineral, especificamente no campo de energia nuclear”, concluiu.

Gostaria que começasse fazendo um resumo sobre sua pesquisa a cerca do setor nuclear brasileiro.

No trabalho, eu faço um levantamento histórico da energia nuclear no Brasil para concluir que há um verdadeiro gargalo jurídico no país, o que inviabiliza o desenvolvimento da tecnologia nuclear como um todo. A minha tese se circunscreve à análise do papel desta necessária evolução do paradigma legal do país em matéria nuclear dentro da questão da energia.

No entanto, é evidente que tornando este mercado [de geração de energia nuclear] mais viável nos pontos de vista da sustentabilidade e da economia, surgirão oportunidades do aproveitamento da tecnologia do urânio não só para energia, mas também em medicina nuclear, ionização de alimentos, agricultura e tratamento de esgoto. É um amplo campo de possibilidades para melhor aproveitamento da tecnologia nuclear.

O nome da minha tese é “O Paradigma da Sustentabilidade e o Uso Pacífico da Energia Nuclear no Ordenamento Jurídico Brasileiro: Possibilidades para uma Nova Matriz Energética do Terceiro Milênio”. Nenhuma matriz energética pode se afastar do paradigma da sustentabilidade. E a abordagem que eu faço é da sustentabilidade e da transnacionalidade. Isto é, analiso o histórico nacional e mundial da energia nuclear; a realidade jurídica de Alemanha, França, Austrália; faço uma ampla abordagem do princípio da sustentabilidade; e analiso a energia nuclear e o direito brasileiro. E demonstro o histórico que demonstra a situação em que nos encontramos.

Quais são os gargalos que existem na legislação brasileira que travam o setor?

O monopólio trava as possibilidades de energia. Há uma rigidez tal na Constituição, que estabelece a competência exclusiva do Congresso Nacional para aprovar iniciativas do Poder Executivo, conforme o inciso 14 do artigo 49 e parágrafo sexto do artigo 225 da Constituição. Ou seja, um controle político da ação do Poder Executivo por meio de uma tutela exercida pelo Poder Legislativo, remontando ao ambiente político de 1956. Este regime é muito equivocado.

Como se não bastasse este regime altamente restritivo sobre a exploração do urânio no país, as Constituições de quase todos os estados do país estão contra a Constituição Federal. A Constituição do Brasil estabelece no artigo 22 que compete privativamente à União legislar sobre atividades nucleares de qualquer natureza. Mas os estados resolveram dispor de sua autonomia sobre as atividades nucleares, proibindo-as. Mesmo que a União tome qualquer decisão, aprovada pelo Congresso Nacional, terá que obter autorização dos estados através das Assembleias Legislativas.

No passado, os serviços e instalações de energia elétrica e o aproveitamento energético dos cursos de água eram de competência só da União, sem a possibilidade de participação privada. Mas esse mercado foi aberto. Por que não fazer o mesmo com o nuclear, já que outros mercados foram abertos?

E o que fazer diante deste cenário?

Usina Nuclear Angra 3Foto- MARCOS MICHAEL 20/06/2018Eu defendo que o Brasil deve buscar um consenso nacional para encontrar os meios e demonstrar à sociedade a importância e a necessidade da energia nuclear por meio de um novo marco constitucional, através de uma emenda, e um novo marco jurídico. O novo marco constitucional é que vai dar configuração a esse novo marco legal. Um novo marco legal que permita a abertura do setor só pode acontecer se houver uma revisão da nossa realidade constitucional.

Como seria este novo marco?

O que eu proponho é que o inciso 23 do artigo 21 da Constituição tenha a seguinte redação: “explorar diretamente ou mediante concessão ou permissão os serviços e instalações nucleares de qualquer natureza, atendido os seguintes princípios e condições”. As alíneas b e c desse inciso 23 seriam alteradas para prever “a instituição por lei de uma ou mais sociedades empresariais capazes de desenvolver as atividades em nome da União, empresas públicas ou sociedades de economia mista”.

O sucesso só será possível com a gestão do estilo privado. Então, eu sugiro também a criação de uma agência reguladora e critérios para a exploração da atividade privada, da mesma forma como aconteceu a abertura dos outros setores energéticos, como o de petróleo.

A alínea c preveria a simplificação de procedimentos para produção, comercialização e utilização de radioisótopos para pesquisa, usos médicos, agrícolas e industriais, entre outros. A alínea d permaneceria com a mesma redação.

Na tese, eu sugiro também a supressão das disposições redundantes do controle político da área nuclear, presentes no inciso 23 do artigo 21, no inciso 14 do artigo 49, e parágrafo sexto do artigo 225. Além disso, a alteração do inciso 5 do artigo 177 na parte relativa à atividade econômica que estabelece restrições à atividade nuclear.

Eu sei que essas mudanças podem se constituir em uma grande dificuldade, principalmente no que se refere ao artigo 225, no seu parágrafo sexto, que fala a respeito da localização de usinas nucleares. É muito complexo mexer com determinadas disposições, especialmente quando se fala em matéria ambiental. Porém, o governo não pode deixar de propor e liderar o debate no sentido de tirar o Brasil do atraso em que se encontra.

A partir destas mudanças, quais seriam os resultados práticos a partir desta flexibilização da nossa legislação?

O que precisamos é que a mineração seja realizada dentro dos parâmetros de sustentabilidade. É isso que defendo também para o campo atômico e do urânio. Tanta riqueza, devemos explorar em comum acordo e cooperação internacional, abrindo nosso mercado. Isso vai gerar renda e riqueza para nosso país. Então, o resultado prático destas mudança seria o aproveitamento da tecnologia existente no mundo inteiro na seara nuclear. O Brasil dispõe de empresas que estão aguardando esse processo, interessadas em investir, aguardando esse processo de abertura econômica do setor para viabilizar uma mudança no paradigma de exploração mineral, especificamente no campo de energia nuclear. 

O que eu busquei na tese foi apontar os percalços históricos, políticos e jurídicos que têm estreitado o espaço do aproveitamento econômico adequado da energia nuclear no cenário energético brasileiro. A tese acabou demonstrando esse ponto de partida do qual eu parti, da ideia de que, sim, possivelmente havia de fato uma grande possibilidade dessa matriz energética servir a essa finalidade do desenvolvimento tecnológico e econômico do país.


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